EDITORIAL (português)
Denise Schaan & Jane Beltrão, Editors

Amazônica apresenta o segundo número de 2010, fechando o segundo ano de existência, atingindo os objetivos inciais: ser um periódico transnacional e multidisciplinar no que tange às áreas de atuação dos antropólogos e disciplinas afins, como a história e a filosofia. Como sempre, os artigos possuem ramificações em mais de um campo do conhecimento e buscam articular o diálogo entre as diversas Amazônias e aquelas regiões que com elas guardam similaridades.


A questão indígena, sempre no centro das preocupações, é tocada no artigo de Ana Padawer, que da Argentina trata de questão atual das estratégias indígenas de reprodução social em espaços em transformação. Os Mbyá-Guarani, aliás, tem sido abordados por diferentes autores nos dois últimos números de Amazônica
– tanto pela pertinência das questões tratadas, quanto por se tratar de grupo étnico que guarda relações com a Amazônia, local onde hoje moram, inclusive, em glebas não originais adquiridas por compra do Instituto Nacional de Reforma Agrária (INCRA) como se fossem estranhos.


As questões do uso da terra na região por pequenos produtores agrícolas é abordada por Luciano Mattos e colegas, chamando a atenção para o fato de que o termo “agricultura familiar” tem servido para mascarar diferentes situações sociais e uma diversidade cultural não contemplada pelas escassas políticas públicas. A importância da Amazônia enquanto região que tem fornecido dezenas de plantas domesticadas e semi-domesticadas de impressionante valor nutritivo para a humanidade é ressaltada pelo artigo de Nigel Smith, Rodolfo Vasquez e Walter Wust, que nos trazem notícias da Amazônia peruana. Nessa edição também temos
a tradução de um controverso artigo de William Denevan sobre o uso de machados de pedra na Amazônia pré-colombiana e as implicações disso para o tipo de agricultura desenvolvida na região. O autor questiona a agricultura de coivara e suas implicações para o entendimento do desenvolvimento sociocultural na Amazônia pré-conquista.

Marilucia Oliveira contribui com um primoroso artigo no campo da sociolinguística, mostrando que especificidades fonéticas da fala de moradores de Itaituba, no Pará, são formas de afirmação do pertencimento local, em contaste aos imigrantes; a análise da linguagem, assim, amplia as perspectivas sobre o estudo da identidade social e aponta a necessidade de ampliação dos estudos de sociolinguística no contexto Amazônico. Língua e sociedade são chaves de compreensão da Amazônia, especialmente da identidade local. O artigo de Eliane Suellen da Silva, Flávio Abreu da Silveira e Hélio Serra Neto nos move para o contexto urbano
carregado dos significados étnicos diversos que compõem a cultura regional, trazendo a beleza dos pássaros juninos que evocam formas de sociabilidade tipicamente paraenses.


Assunto pouco estudado – o comércio das pedras verdes tão faladas durante o período inicial do contato e marca das sociedades complexas amazônicas que foram exterminadas pelos conquistadores – é trazido por André da Silva Lima, com dados inéditos compilados em minuciosa pesquisa histórica. Temos certeza de que este artigo será de grande interesse para arqueólogos e historiadores do período. A arqueologia também vem contemplada na notícia da pesquisa de Lilian
Rebellato sobre as terras pretas amazônicas.


Os resumos de teses e dissertações, assim como as resenhas vem a fechar essa edição cuidadosamente preparada. Chamamos a atenção dos leitores para duas teses polêmicas e oportunas: de Florêncio Vaz sobre os índios “ressurgidos” do Tapajós, e de Maria de Jesus Morais sobre a re-invenção da identidade acreana na contemporaneidade. As resenhas contemplam três trabalhos que guardam entre si a conexão das dinâmicas do patrimônio e da memória, além de remeter o leitor às cosmologias que nos orientam e nos guiam por mais que não se deseje. Paisagens, memórias e patrimônios constituem a tônica dos livros resenhados. O Ensaio Fotográfico é um show à parte, trazendo as lindas expressões faciais e corporais de mulheres indígenas e quilombolas que lutam, dançam, trabalham e festejam a vida em meio à multitude de modos de ser amazônidas.

 

EDITORIAL (English)
Denise Schaan & Jane Beltrão, Editors

Amazônica presents its second issue of 2010, finishing its second year of existence, reaching its initial goals: being a transnational and multidisciplinary journal with regard to areas of expertise of anthropology and related disciplines such as history and philosophy. As always, the articles have branches in more than one field of knowledge and seek to articulate the dialogue between the various Amazonias and those regions with which they hold similarities.


The indigenous subject, always at the center, is the focus of Ana Padawer’s article, who discusses indigenous strategies of social reproduction in changing contexts
in Argentina. The Mbyá-Guarani, indeed, has been approached by different authors in the last two issues of Amazônica - both for its relevance, and because they are an ethnic group that holds relationships with Amazonia, where they live today, even if in plots purchased by the National Institute of Agrarian Reform (INCRA) as if they were foreigns in the region.


Small farmers land use strategies are approached by Luciano Mattos and colleagues, drawing attention to the fact that the term “family agriculture” has served to mask different social situations and cultural diversity not acknowledged by public policies. The importance of the Amazonia as a region that has provided tens of domesticated and semi-domesticated plants with impressive nutritional value to humanity is underscored by an article by Nigel Smith, Rodolfo Vasquez and Walter Wust, who bring us news from the Peruvian Amazon. In this issue we also have an opportune translation of a controversial article by William Denevan on the use of stone axes in the pre-Columbian Amazon and their implications for the type of agriculture developed in the region. The author questions the swidden agriculture and its implications for understanding the social and cultural development in the pre-conquest period.


Marilúcia Oliveira contributes an exquisite article in the field of sociolinguistics, showing that phonetic speech characteristics of residents of Itaituba, in Pará, are ways of affirming their local ties, as opposed to immigrants. The analysis of language thus broadens the perspectives on the study of social identity and highlights
the need to enhance the study of sociolinguistics in the region. Language and society are key to understanding the Amazonia, especially regarding local identity. The article by Suellen Eliane da Silva, Flavio Abreu da Silveira and Hélio Serra Neto moves us into the urban context, loaded of the meanings that make up the diverse ethnic cultures of the region, bringing the beauty of Pássaros Juninos (June Birds) that evoke forms of sociability unique to Para.


André da Silva Lima highlights a subject little studied - the green stones trade during the contact period, a feature of the Amazonian complex societies that were exterminated by the conquistadors - presenting a careful historical research with many unknown data. We are sure that this article will be of great interest to archaeologists and historians of the period. Archaeology has also been covered in the research news section by Lilian Rebellato, through a timely discussion on amazonian black earths.


Abstracts of theses and dissertations, as well as the book reviews wrap up this carefully prepared issue. We call the readers’ attention to two controversial and opportune dissertations: Florencio Vaz’s investigation on “resurgent” Indians along the Tapajós, and Maria de Jesus Morais’ brillant approach of the Acrean reinvention of identity. The book reviews include three volumes that bridge the dynamics of heritage and memory, besides showing the reader cosmologies that guide us even if we don’t want to. Landscapes, memories and heritage are the focus of the reviewed books. Finally, the photo essay is a sideshow, bringing the beautiful expressions of indigenous and maroons’ women that fight, dance, work, and celebrate life amid the multitude of ways of being Amazonians.