O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da hidrelétrica de Belo Monte, proposta pelo Governo Federal para construção no rio Xingu, no Pará, mostra quão pouco o processo de avaliação ambiental no Brasil avançou desde 1986, quando o EIA ficou obrigatório para barragens e outros projetos de infraestrutura. O documento evita completamente os impactos principais que a barragem teria induzindo a destruição de áreas muito mais extensas a montante da represa, criando uma “crise planejada” que proveria a justificação para criar reservatórios muito maiores rio acima, particularmente a barragem de Babaquara, ou “Altamira”, que inundaria 6.140 km2, tudo em floresta tropical e a maior parte em terra indígena. O relatório também subestima grosseiramente as emissões de gases de efeito estufa da represa, alegando que as emissões de metano seriam mínimas baseado em uma estimativa que ignora completamente os estudos na literatura científica que indicam emissões significantes da água que atravessa as turbinas de hidrelétricas. O documento considera apenas as emissões relativamente pequenas que ocorrem por meio de bolhas e de difusão pela superfície do próprio reservatório. Porque a vazão do rio Xingu é altamente sazonal, a eletricidade que pode ser produzida por Belo Monte (sem as represas, não mencionadas, rio acima) é insuficiente para justificar o custo da barragem, as linhas de transmissão, subestações e outra infraestrutura. O EIA focaliza exclusivamente na própria barragem, assim ignorando a inviabilidade econômica do projeto global e as implicações disto para a construção de represas altamente prejudiciais rio acima. Muito da eletricidade a ser gerada será usada para produção de alumina e alumínio para exportação, que é um dos usos com o menor benefício possível para a população brasileira, devido à quantidade extremamente pequena de emprego criado por cada GWh de energia. Uma discussão nacional sobre como a energia elétrica é usada no País nunca aconteceu, e agora deveria ser uma condição prévia para quaisquer dos projetos de construção de barragens planejadas na Amazônia. Uma vez tomadas decisões racionais sobre o uso de energia, os custos e benefícios ambientais e sociais de cada barragem proposta devem ser avaliados de modo justo e aberto, o que não foi o caso com Belo Monte até agora.
Biografia do Autor
Philip Martin Fearnside, INPA
Coordenação de Pesquisas em Ecologia (CPEC), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA)